Segundo dia do FONTET é marcado por debates sobre trabalho degradante, proteção de vítimas e tecnologia
O segundo dia do Fórum Nacional de Combate ao Tráfico de Pessoas e ao Trabalho Escravo (FONTET) promoveu debates sobre formas contemporâneas de exploração e estratégias de acolhimento a vítimas. A programação aconteceu na Universidade Ceuma, em São Luís (MA), e reuniu cerca de 300 representantes do sistema de Justiça, pesquisadores, entidades da sociedade civil e profissionais que atuam na área.
A programação da manhã começou com um painel conduzido pelo conselheiro do CNJ Alexandre Teixeira de Freitas Bastos Cunha, que abordou o tema “Trabalho Escravo Doméstico e Racismo Estrutural”, com a participação da professora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) Flávia Moura; da representante da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (FENATRAD) Maria Isabel Castro; e da integrante da Secretaria de Inspeção do Trabalho Tatiana Fernandes Rocha Lima.
Durante a exposição, Maria Isabel Castro falou sobre a necessidade de políticas públicas mais eficazes para proteger as trabalhadoras domésticas, em especial quanto à fiscalização. Segundo ela, a natureza privada do ambiente de trabalho contribui para a invisibilidade de abusos e para a persistência de práticas violadoras de direitos, como o trabalho infantil. “É essencial um olhar atento para essas mulheres, que muitas vezes trabalham sozinhas e continuam invisíveis, apesar dos avanços legais”, pontuou.
As participantes também apresentaram dados que demonstram como o trabalho doméstico é exercido majoritariamente por mulheres negras (63%), e ainda, está associado à reprodução de desigualdades estruturais e violações de direitos humanos no Brasil.
Na sequência, o painel “Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo: experiências do pós-resgate” trouxe relatos sobre os desafios enfrentados pelas vítimas após serem libertas de situações de exploração. O momento foi mediado pelo juiz auxiliar da Presidência do CNJ e membro do Comitê Nacional do FONTET, Jônatas Andrade.
Participaram da mesa, a representante do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos (CDVDH) de Açailândia/MA, Mariana de La Fuente e o secretário adjunto dos Direitos Humanos da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (SEDIHPOP/MA), Daniel Formiga. Eles compartilharam experiências de acolhimento, reinserção social e implementação de políticas públicas no período pós-resgate.
Encerrando a manhã, o painel “Escuta Qualificada na Proteção de Vítimas de Tráfico de Pessoas e do Trabalho Escravo” trouxe um enfoque técnico sobre a importância de um acolhimento respeitoso e humanizado. O juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo e membro do Comitê Nacional do FONTET, Paulo Fadigas; o juiz Otávio Ferreira, do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA/AP); e a pesquisadora Mônica Bernardes, do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Cognição e Justiça (COGJUS), abordaram a relevância da escuta humanizada, respeitosa e interdisciplinar no processo de responsabilização e garantia de direitos.
No período da tarde, a programação contou com um debate sobre os desafios trazidos pela tecnologia no combate ao trabalho infantil. O painel “Trabalho Infantil e Indústria Tech: indústria de games e inteligência artificial” reuniu a jornalista investigativa Isabel Harari, da Repórter Brasil, e a juíza do Ministério Público do Trabalho do Paraná, Luísa Carvalho Rodrigues, especialista na defesa dos direitos de crianças e adolescentes. A mediação foi feita pela juíza Gabriela Lenz de Lacerda, do TRT da 4ª Região (RS), gestora nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil da Justiça do Trabalho.
As expositoras analisaram como o ambiente digital tem contribuído para novas formas de exploração do trabalho infantil, especialmente por meio de plataformas e da indústria dos games. A jornalista destacou mecanismos de aliciamento presentes no universo on-line, enquanto a juíza enfatizou os desafios jurídicos enfrentados pelo sistema de Justiça, com base no Código Civil, ao tratar de temas como publicidade infantil e atuação de menores em meios digitais.
Encerrando as atividades do evento, os participantes se dividiram em grupos para oficinas práticas voltadas à discussão de casos concretos relacionados ao trabalho escravo, exploração sexual, trabalho doméstico análogo à escravidão e trabalho infantil. A atividade teve caráter colaborativo e foi conduzida por facilitadores que orientaram as equipes na construção de propostas de encaminhamento e soluções para os desafios apresentados.
O FONTET é promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com organização conjunta do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região (Maranhão) em parceria com o Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) e a Justiça Federal 1ª Região (TRF-1), além do apoio da Escola Superior da Magistratura do Maranhão (ESMAM), que transmitiu todo o evento pelo Youtube.